segunda-feira, 6 de junho de 2016

DIÁLOGO PARA A PAZ EM MOÇAMBIQUE



1o. junho 2016, Odiário.info http://www.odiario.info (Portugal)


A simples nomeação dos membros das duas delegações às conversações entre o governo de Moçambique e a oposição é uma boa notícia para todos os moçambicanos.

«Apesar da repetida disponibilidade do presidente Nyusi em negociar com Dhlakama, este, com declarações contraditórias e comportamentos erráticos, tem-se recusado a sentar à mesa de conversações».

Com esta decisão renovam-se as esperanças que, desejamos não sejam em vão…
 
O presidente da República de Moçambique, Filipe Nyusi, também dirigente da Frelimo, no poder, saudou o previsto recomeço do diálogo político com a Renamo, na oposição, tendo em vista a paz e a normalização no país.

Falando no sábado [21 de maio] em Jinan, na República Popular da China – no final de uma visita em que foram assinados entre Pequim e Maputo acordos de cooperação económica mas também de reforço das relações militares e de segurança,
no quadro de uma «parceria estratégica global» –, Nyusi, citado pela AIM, agência noticiosa moçambicana, comentou que a anuência da Renamo em sentar-se à mesa de negociações «é a notícia de que o povo moçambicano estava à espera».

A missão das delegações do governo e da Renamo, segundo a AIM, é apenas preparar as condições para uma reunião entre o presidente da República e Afonso Dhlakama, o controverso líder oposicionista.

O presidente mostrou-se optimista, disse que só na cimeira é que serão «tomadas decisões vinculativas» e manifestou a convicção de que o encontro «vai acontecer e vai ser produtivo». Contudo, criticou os ataques armados contra civis em estradas da região central de Moçambique, da responsabilidade do «braço armado» da Renamo. «Fazer pressão através de ataques armados é uma velha táctica que não funciona», advertiu. E esclareceu que a resposta do governo tem sido exortar as Forças de Defesa e Segurança de Moçambique a manter a calma e a não responder a provocações, procurando defender o povo e proteger as colunas de transportes nas estradas em risco.

O governo tinha nomeado em Março uma equipa para participar do processo de retoma de conversações e, agora, em finais de Maio, a Renamo anunciou os nomes dos seus três negociadores. Jacinto Veloso, membro do Conselho Nacional de Defesa e Segurança e antigo ministro da Segurança, Benvinda Levy, conselheira do presidente, e Alves Muteque, dos serviços da presidência da República, foram os designados por Nyusi. Quanto a Dhlakama, indicou os nomes de José Manteigas, Eduardo Namburete e André Magibiri, todos deputados do seu partido.

Situação singular
O diálogo entre o governo e a Renamo tinha começado em Abril de 2013 e fora interrompido em meados de Agosto de 2015, quando os representantes oposicionistas abandonaram o processo.

Para reatar as conversações, o chefe da oposição exigia a presença de mediadores internacionais, designadamente o presidente da África do Sul, Jacob Zuma, e representantes da União Europeia e da Igreja Católica. A exigência não foi aceite por Nyusi e, pelo menos para já, o diálogo será só entre as duas partes.

Moçambique, com 25 milhões de habitantes e um enorme potencial de desenvolvimento (gás, carvão, recursos hidroeléctricos, agricultura, pesca e outras riquezas naturais), espera um crescimento económico da ordem dos seis ou sete por cento do PIB em 2016 e 2017, uma das maiores taxas na África.

A situação, contudo, agravou-se desde há alguns meses, com a desvalorização do metical em relação ao dólar e a suspensão da «ajuda» do Fundo Monetário Internacional, do Banco Mundial e dos países ocidentais, quando foi conhecida, em Abril, a existência de dívidas do Estado moçambicano, fora das contas públicas, no valor de 1,2 mil milhões de euros. Essas dívidas foram contraídas em 2013 e 2014 (no mandato do presidente Guebuza) e são justificadas por razões de segurança e de construção de infra-estruturas estratégicas.

Nestes 40 anos de independência, o país tem sido governado pela Frelimo e hoje vive uma situação política e militar singular. Nos últimos tempos têm aumentado os confrontos militares entre bandos da Renamo e forças de defesa governamentais, sobretudo nas províncias do centro e Norte (Manica, Sofala, Zambézia e Tete).

A Renamo apresenta duas faces – uma, a de um partido na oposição, com os seus deputados trabalhando «normalmente» no parlamento; e outra, a de um grupo armado que ataca colunas, faz emboscadas a autocarros, rapta autoridades locais, provoca vítimas. O seu líder vive escondido, supostamente algures na serra da Gorongosa, mas dá entrevistas e presta declarações, com frequência, aos media moçambicanos e estrangeiros.

Apesar da repetida disponibilidade do presidente Nyusi em negociar com Dhlakama, este, com declarações contraditórias e comportamentos erráticos, tem-se recusado a sentar à mesa de conversações. Com um discurso belicoso, rejeita os resultados das eleições presidenciais e legislativas de finais de 2014, ganhas pela Frelimo, e ameaça «tomar o poder» pela força (o prazo era até ao fim de Março) nas seis províncias do centro e Norte, as mais povoadas, onde alega ter obtido a maioria dos votos.

Agora há, de novo, a expectativa de um diálogo para a paz.

Texto publicado no Avante nº 2217 de 25 de maio de 2016.

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