segunda-feira, 27 de setembro de 2010

¿QUÉ PASA EN CUBA?

Elaine Tavares *

22 de setembro de 2020 setembro 2010/Agência de Informação Frei Tito para a América Latina
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Cuba é mesmo uma gigantesca pedra no sapato do sistema capitalista. Tanto que qualquer coisa que por lá acontece, vira logo manchete da CNN, braço propagandístico do governo estadunidense. Agora, a bola da vez são as demissões que foram anunciadas por Raul Castro. Histericamente, as jornalistas bem apessoadas da Venus de Atlanta, falam em derrocada do sistema cubano. É o fim do socialismo, guincham, aliviadas. É, porque o tal do regime cubano é uma excrescência que sobrevive há mais de 50 anos a todos os ataques do sistema capitalista e do governo mais armado do mundo. Não é sem razão que os suspiros aliviados sejam uma constante na mídia mundial, que reproduz acriticamente as histerias "ceeneanas". Mas, para quem consegue enxergar além da ideologia, a questão cubana pode ser explicada de forma menos simplista.

Em primeiro lugar, como bem lembra o professor Nildo Ouriques, do IELA, em entrevista à CNN, Cuba nunca foi um país congelado. A cada aperto da conjuntura o país se analisa e inventa saídas econômicas e políticas para suas crises. Foi assim quando ruiu o sistema soviético. Todo mundo capitalista apostava na derrocada das conquistas da revolução. Não haveria saída para Cuba. Mas, num esforço descomunal a ilha se refez e seguiu em frente. Naqueles dias, a abertura para o turismo acabou sendo uma resposta eficaz para garantir ingressos ao país. Muitas foram as críticas e boa parte do mundo apostava que esta abertura iria levar o país para a órbita do sistema capitalista. É certo que vieram muitos problemas com esta medida, mas as conquistas básicas da revolução seguiram existindo. Saúde, educação, cultura, moradia, comida e, fundamentalmente, soberania nacional. Depois, com a doença de Fidel, nova gritaria geral. "Agora acabou", vaticinavam as harpias (aves de rapina das mais ferozes).

Hoje Cuba enfrenta novos problemas conjunturais. Há uma grande parcela da população que não viveu a revolução e que, de certa forma, vive apática diante das conquistas. Isso é um problema e tanto para o governo. Há que imprimir horizontes na rota da juventude. Além disso, há um crescimento e congelamento da burocracia estatal, o que dá mais imobilidade o sistema. Um pouco é isso que Raul Castro quer desfazer com essa proposta de demissão de 12% dos funcionários públicos. Segundo o presidente cubano, essas demissões não afetarão os serviços estratégicos que se configuram as conquistas da revolução. Existem critérios muito claros para as demissões e elas serão feitas em setores onde a máquina está definitivamente inchada e inerte.

A proposta do governo é permitir e incentivar que os trabalhadores cubanos possam investir em outros tipos de negócios que vão desde propostas de trabalho privado a cooperativas. No geral, os cubanos estão gostando desta iniciativa, uma vez que sempre houve reclamações com relação aos salários, considerados baixos, apesar de todos terem garantidos os serviços de educação, saúde e moradia. "Eu estive em Cuba há pouco tempo e pude ver e ouvir das pessoas o apoio a estas medidas. Há uma discussão pesada sobre a questão moral que é central neste momento: há gente roubando do estado e isso não pode acontecer. Porque roubar o estado é roubar toda a gente. E também há um desejo das pessoas por mudanças na economia. A maioria apóia essa proposta de se criar pequenos negócios", diz Nildo Ouriques, professor e economista.

Agora, o governo quer descongelar a máquina estatal e isso também é saudado por uma parcela do povo que sempre se ressentiu dos burocratas encravados na máquina governamental. Os trabalhadores, há tempos, buscavam abertura no governo para trabalharem fora do Estado e isso aparece agora como uma boa oportunidade. E, na verdade, já se formava em Cuba uma espécie de mundo paralelo, no qual os trabalhadores usavam seu tempo vago para arranjar alguma coisa "por fora". E esse "por fora", além de envolver trabalho privado, também funcionava como um mercado igualmente paralelo, formado por coisas roubadas do estado, como já relatou e analisou em seus textos semanais o próprio Fidel Castro. Esse trabalho ilegal agora não mais o será. Assim como tende a desaparecer o mercado paralelo. Pelo menos é o que pretende o governo com essas medidas.

Por outro lado, na camada de trabalhadores que sempre esteve nos quadros do Estado, há um grande medo com relação ao futuro. Muitos deles não saberiam o que fazer longe da máquina estatal. Mas, o próprio governo cubano já deixou claro que vai ajudar aos trabalhadores a encontrarem um caminho nesta nova conjuntura, inclusive garantindo o crédito. A maioria, que segue acreditando no processo revolucionário, sabe que muito do que hoje têm de conquistas devem à revolução e estes seguirão fazendo aquilo que é melhor para Cuba. Raul Castro tem dito que o regime cubano haverá de encontrar os caminhos para resolver seus problemas como sempre fez. Mais de 100 novas atividades, antes só permitidas no âmbito estatal, poderão ser realizadas por pessoas fora da máquina. Será necessário criar toda uma nova infraestrutura para esta gente, mas o grupo governante acredita que, coletivamente, o povo cubano pode encontrar as respostas.

A Central de Trabalhadores Cubanos fez um pronunciamento a todos os cubanos onde conclama para a unidade e para manter em marcha os ideais da revolução: "A unidade dos trabalhadores cubanos e de nosso povo tem sido chave para materializar a gigantesca obra edificada pela Revolução e, nas transformações que agora empreendemos, ela continuará sendo nossa mais importante arma estratégica". Segundo a CTC, o Estado não pode mais continuar com o mesmo modelo de empresas ineficazes, com quadros inflados. Assim, respalda a proposta governamental de ampliar e diversificar as opções que resultam em novas formas de relação trabalhista. A Central acredita que tudo isso vai ser bom para Cuba e para os cubanos.

Fidel Castro sempre disse e continua afirmando isso: as saídas encontradas por Cuba ao longo destes anos todos são as saídas cubanas. Não adianta a esquerda mundial se escabelar querendo que a ilha permaneça imutável diante das mudanças do mundo. São os cubanos que sabem de seus problemas e são eles os que encontrarão as formas de superá-los. Como lembra Raul, Cuba está frequentemente mudando para tentar seguir sempre a mesma: aquela que garante ao seu povo as conquistas da revolução.

Analistas do mau agouro insistem em dizer que o regime faliu, que está se entregando ao capitalismo, que o povo cubano não quer mais viver à margem do sistema capitalista, que as gentes querem poder comprar coisas bonitas e viverem em liberdade. Mas, para os dirigentes cubanos há uma grande distância entre o sistema privado capitalista (no qual um empresário é dono da força de trabalho e da mais-valia de milhares) e o chamado "trabalho por conta própria", o que está sendo agora incentivado. Este é o pequeno negócio, em nada parecido ao sistema de exploração capitalista. Nos seus discursos e nas conversas com a população Raul Castro tem dito que o estado cubano precisa melhorar sua produtividade, inclusive, para seguir garantindo os serviços públicos de qualidade ao povo. Nas vozes que se podem escutar em outras fontes que não as da CNN há uma boa expectativa. Os trabalhadores sabem que o número soa alto demais quando se fala em 500 mil despedidos, mas por outro lado, dizem que boa parte destes trabalhadores já tinha trabalhos paralelos. O governo cubano vai amparar quem tiver dificuldade. Assim diz Raul, em diversos comunicados divulgados pela televisão, pelos jornais e pelo rádio.

As mudanças em Cuba apontam para cenários múltiplos, é certo. Pode acabar o socialismo, pode crescer a iniciativa privada, pode mudar a mentalidade do povo, pode crescer a idéia do consumo, podem ruir as conquistas da revolução, pode fortalecer ainda mais o sistema, pode avançar no socialismo. Sim, tudo está aberto. Na verdade, sempre foi assim. O horizonte, desde a heróica conquista em janeiro de 1959, tem se apresentado como um quadro a ser pintado, permanentemente, porque a revolução não é uma coisa cristalizada. Ela é um processo. Para os velhos militantes, a esperança é que estes 50 anos de educação, cultura e luta pela soberania nacional façam valer o que já foi conquistado. Eles fazem questão de lembrar que nestes mais de 50 anos houve um bloqueio feroz e, por vezes, desumano, contra o país e contra o povo cubano. E Cuba sempre conseguiu se reinventar. Agora, a ilha passa por nova onda de mudanças. Haverá de encontrar seus caminhos. A diferença, creem, é que o governo e o povo fazem isso juntos e de forma soberana.

Enfim, Cuba segue seu caminho, com todas as suas limitações, seus erros, mas também seus acertos. O povo cubano responderá à história.

* Jornalista

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