terça-feira, 22 de maio de 2007

O Brasil, imperialista?

Vermelho, Editorial, 21 de Maio de 2007

Brasil, um país imperialista e explorador, afirmou o diário ABC Color, principal jornal do Paraguai, no título de seu editorial, publicado na primeira página da edição deste domingo. O tema: ''As descaradas injustiças que o Paraguai sofre na binacional Itaipu''. O motivo: a chegada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Assunção, em viagem oficial. O texto diz que ''a desapiedada e tirânica exploração'' gera ''frustração e rancor'' na população paraguaia, o que ''poderia criar situações de violência física''. Hoje, novo editorial do ABC volta à carga: Injusta situação de Itaipú conduz à violência.

Acusações de imperialismo brasileiro têm vindo à tona também na Bolívia, Uruguai e outros países. Merecem exame.

O Brasil não é um país imperialista na acepção do termo. Ao contrário, foi e é ainda um país dependente, dominado, explorado e oprimido pelo imperialismo. Este, enquanto fase e modalidade específica do capítalismo, nasceu há pouco mais de um século com a fusão do grande capital banqueiro e industrial, nas metrópoles do sistema. E possui características tais que mantêm fechado desde então o restrito clube das potências imperialistas originais: Inglaterra, França, Alemanha, Estados Unidos, Japão.

No entanto, esta constatação não desobriga as forças avançadas brasileiras de encarar com olho crítico o papel do Brasil na relação com os vizinhos: historicamente ele tem sido, em essência, o de uma reserva das forças mais reacionárias na região.

Não é um papel ditado pelo tamanho ou a riqueza, mas pelas circunstâncias históricas. Enquanto o grosso das nações latino-americanas nasceu da epopéia revolucionária de Bolívar, San Martín e outros, inspirada nas revoluções norte-americana e francesa, no Brasil o processo da independência, truncado, resultou em uma monarquia escravista. E esta interveio com sentido reacionário em todo um ciclo de aventuras militares na Bacia do Prata, desde a Guerra Cisplatina (1825-1828) até a carnificina no Paraguai (1864-1870), o conflito mais mortífero que as Américas já conheceram. Sob a República, foi o regime brasileiro de 1964-1985 que ajudou Washington a exportar para os vizinhos o modelo das ditaduras militares pró-EUA, e a montar a Operação Condor, uma agência multilateral de repressão.

Essa tradição representa o oposto daquela, solidária e libertária, que sempre existiu, em figuras como Abreu e Lima, e hoje, fortalecida, leva avante o projeto da integração sul-americana. A transformação do papel regional do Brasil, de reserva da reação em impulsionador de uma integração de iguais, é uma das mudanças mais notáveis da cena latino-americana recente.

Como regra, as classes dominantes de todos esses países voltam as costas para a integração. Um vício secular faz com que só tenham olhos para a metrópole de turno.

O exemplo mais conhecido dos brasileiros é o do ''patriota'' e ''nacionalista'' Geraldo Alckmin, nos debates do segundo turno da eleição de outubro, a acusar Lula de ''fraco'', por não arreganhar os dentes para a Bolívia de Evo Morales, quando esta nacionalizou seus recursos petrolíferos. Mas cada país da região tem os seus Geraldos Alckmin, sempre engajados em uma boa futrica, ''nacionalistas'' para com os vizinhos, servis para com o imperialismo que a todos nos avassala.

No esforço pela integração continental, o governo Lula se depara muitas vezes com os efeitos do papel do Brasil no passado, e com os ressentimentos legítimos dos que sofreram com ele. Tem respondido, como respondeu nos debates com Alckmin, com a ''diplomacia da generosidade''. É justo. E é benéfico. O projeto integracionista tem que ser enxergado não com a ótica míope de um contador ou de um rábula, mas com o olhar no horizonte, como fazem os estrategas e estadistas. Sob este prisma, todos os sofridos povos desta parte do mundo só temos a ganhar com ele.

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